21 de abr. de 2010

“Divã” de Martha Medeiros. Objetivo (2001), 160 páginas.


Imagine ler um livro em que a personagem principal faz terapia. Imagine ainda que esta personagem tenha sentimentos como angústias, dúvidas que aflige a maioria de nós. Este é o caso da obra-prima escrita por Martha Medeiros. É impossível não se identificar com os sentimentos da personagem, parece que Martha leva o próprio leitor para o divã, parece que cada leitor faz terapia junto com Mercedes (a personagem) e Lopes (o terapeuta).

O livro é dividido em vários pequenos capítulos, capa um para uma consulta ao longo dos três anos que Mercedes faz terapia. Nestes pequenos capítulos ela fala de assuntos tão diversos como a perda precoce de sua mãe aos oitos anos até de sua infidelidade conjugal. O sentimento pelos filhos, o divórcio e a morte de pessoas próximas são alguns dos temas delicados abordados com maestria por Martha Medeiros.

O ponto alto do livro são as frases que precisamos anotar antes de ir a nossa próxima sessão de análise, pois elas parecem ter sidos escritos para cada um de nós. Como na página 26 “Nenhuma vida é original. Nascemos e morremos, e no espaço entre uma coisa e outra estudamos, trabalhamos, casamos, temos filhos e netos, praticamos exercícios, adoecemos. Ninguém escapa deste script, não há opções”. Na página 83 “O que acontece com os outros que possa a vir me interessar? A experiência deles, talvez, mas nunca um fato que seja alheio à minha pessoa, que não me comova ou me alimente. O inferno sem o não são os outros. O inferno são os outros sem atrativos para mim”.

Na página 87 “Eu uso com regularidade expressões como ‘graças a Deus’, ‘pelo amor de Deus’, ‘que Deus te ouça’, mas Deus é o apelido que dou à sorte. Em sorte eu acredito”. Na página 107 “Vou acordar outro dia, escovar os dentes, vestir um casaco, trabalhar e conviver em sociedade com harmonia e educação, e ninguém perceberá a erupção que tento conter. Como somos bons atores”. Na página 123 “As pessoas boas e generosas sabem como fazer um rocambole com a mentira e com a verdade, deixando tudo com o mesmo gosto”.

Na página 124 “Não precisem de mim com hora marcada e por motivo concreto, precisem de mim a todo instante, a qualquer hora, sei ouvir o chamado silencioso da amizade verdadeira, do amor que não cobra, estarei lá sem que vejam, sem que me percebam, sem que me avaliem.” Na página 132 “Mas é fato, ando com preguiça de interpretar o mundo, de entender as pessoas, de procurar os sete erros. Gostaria de ter todas as respostas na última página, de ter um manual de atitudes sensatas, de ter o pensamento voltado pra Meca”.

Página 153 “Nunca assisti a um atropelamento. Nunca ganhei um concurso. O que vivi até agora hoje foi o que costuma ser vivido por todos, não houve nada exótico em minha vida, como não há na vida da maioria das pessoas. Tive um número restrito de experiências, todas bastantes previsíveis, mas enquanto eu estiver em movimento dentro do tempo que me foi dado viver, nenhuma idéia ou vivência poderá ser conclusiva”. E na página 154 “ Ainda não tentei muitas coisas. Não tentei aprender a tocar um instrumento, não tentei escrever um poema, não tentei fazer minha declaração de imposto de renda sozinho, não tentei morar no vigésimo andar, nunca fui a um terreiro, nunca assisti a uma Copa do Mundo, nunca aprendi a linguagem dos surdos-mudos”.

Classificação pessoal e arbitraria: cinco estrelas.

Um comentário:

  1. Felipe

    Vi o filme em que a Lilian Cabral interpreta a Marcedes e achei muito bom, divertido e emocionante, pena que depois de ver não tem mais graça ler. Não consigo ler um livro depois de saber sua história ou de vê-lo reproduzido em um filme. O contrario já é mais comum, mas mesmo assim sempre me decepciono com o filme, pois nunca conseguem reproduzir o livro na integra e as vezes mudam alguns detalhes que perecem ser tolos, mas na verdade fazem "parte" da essência do livro.

    Eu também tenho um blog sobre livros, copiei de ti hehehe...dê uma espiadinha lá.
    http://leniseleu.blogspot.com/

    Abraços

    Lenise

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