14 de ago. de 2011

"Pilatos" de Carlos Heitor Cony. Alfaguara (2009), 224 páginas.




Cony dispensa maiores apresentações, ele é dos maiores escritores brasileiros vivos e membro da Academia Brasileira de Letras. Em sua biografia, o que mais chama atenção é que quando publica um livro, seu nono, na década de 1970, resolve não mais escrever por estar satisfeito. Apesar de ter declinado de sua decisão mais de vinte anos depois, o livro que levou a este extremo deve ser muito especial, se trata de “Pilatos” e não decepciona em momento algum, é um livro obrigatório.
Se fosse possível apenas uma palavra para definir o livro de Cony eu escolheria surreal. Ao melhor estilo Kafka ele nos leva a situação, surreais, que divertem, angustiam e fazem refletir. O personagem principal e narrador, que tem seu revelado apenas uma vez e quase no fim do livro, é um revisor de um órgão de impressa a beira da falência que mora em um quarto de pensão em estado de quase miséria. As coisas pioram para ele quando ele sofre um grave acidente ao ser atropelado.
No hospital ele descobre que no acidente ele teve seu pênis decepado, e terá que se contentar com um tubo plástico no lugar apenas para urinar. Com uma solidariedade mórbida, as freiras do hospital guardam o pênis em uma recipiente, que vira um talismã para o personagem principal que o carregará durante quase toda a narrativa. Após escapar de uma tentativa de homicídio no hospital, ele é liberado e descobre que está na mais profunda miséria e terá que dormir na rua. Lá ele encontra o outro protagonista do livro, Dos Passos.
Juntos, o narrador e Dos Passos passam para situações mais absurdas possíveis. Entre elas, cedem o pênis do narrador para ser filmado como ator principal em um filme, são presos e torturados, participam de casos de sodomia entre muitas outras. As torturas são uma denúncia sutil de Cony ao momento político em que se passava na década de 1970, com a ditadura militar.
Outro destaque do livro são as histórias escritas por Dos Passos, que Cony reproduzir integralmente em seu texto. Estas metanarrativas são mais absurdas e surreais que a própria narrativa.
Porém o grande destaque para mim foi o fim do pênis do narrador e sua ligação com a demissão dele do seu emprego em um botequim de um português. Ambos as situações, que estão ligados, beiram o mais absurdo dos absurdos e por isto mesmo desconfiam que possam até ser reais.
A morte de Do Passos é mais tradicional, assassinado por engano. O livro começa e termina com este episódio e com a incerteza quanto a vida e sobrevivência do narrador, que pode estar muito bem em cada de nossas esquinas.





Classificação pessoal e arbitrária: quatro estrelas e meia

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