É difícil definir este livro de Nelson Motta, exitem algumas possibilidades: de memórias, uma autobiografia, uma biografia da música brasileira da segunda metade do século XX ou ainda um romance histórico ou baseado em fatos reais. Qualquer uma das possibilidades define bem "Noites Tropicais".
O protagonista é o próprio Nelson Motta, que não se limita a contar sua vida ligada a música; fala dos pais, filhas, namoradas, esposas e de suas angústias - quase uma análise. Os coadjuvantes principais já são por si só um motivo para lê-lo: João Gilberto, Elis Regina, Caetano, Tim Maia, Chico, Gil, Marisa Monte e todos os monstros sagrados da MPB.
O livro começa junto com o início da Bossa Nova, com o lançamento de "Chega de saudade" de João Gilberto, e junto com a música a paixão de Nelson Motta por ela. No início o que tedia um pouco o leitor são vários nomes dos bastidores do movimento da Bossa Nova que são completamente desconhecidos para nós, mas com quem Nelson Motta teve contato e que, segundo sua narrativa, tiveram papel importante para a consolidação da música popular brasileira.
Os detalhes dos bastidores dos festivais são um deleite ao leitor, que como eu, nasceu muito depois do auge destas disputas de cantores e compositores. Os programas de televisão que eram verdadeiros musicais também são descritos em detalhes, incluindo os apresentados por Elis e Jair (O fino) e por Vanderleia, Roberto e Erasmo (Jovem Guarda), ambos pelo Record e que provocavam uma rivalidade entre estes mitos de nossa música. O papel de Nelson como jurado em alguns programas tem destaque em sua narrativa deste período que termina com o declínio dos festivais e a ascenção das telenovelas e do "Programa Silvio Santos".
Outro destaque é o nascimento do Tropicalismo tendo como pano de fundo os primeiros anos do regime militar e o AI-5 em 1968. Com a repressão e censura vieram a prisão de Chico, Caetano e o exílio deles e de muitos outros. Neste período Motta narra a grande popularidade de Wilson Simonal e sua queda acusado de ser dedo duro para a máquina de repressão dos militares. Mas o surgimento da carreira de Tim Maia é contada com entusiasmo pelo autor.
A vida amoroso de Nelson Motta se torna interessante quando ele conta o seu romance extra-conjugal com Elis Regina e a forma como ela o rompeu pelo telefone. Após Elis, Nelson se casa com Marília Pera e Elis tenta retornar o seu romance com ele ao melhor estilo pimentinha, objetivo não logrado de acordo com Motta.
Os pontos de destaque da década de 1970 são o surgimento de Raul Seixas e seu parceiro musical de primeria hora Paulo Coelho, o movimento disco e o auge das discotecas no fim da década e o papel fundamental de Motta para o sucesso das Frenéticas e o início de sua carreira como dono de casas noturnas. Entre estas casas a quase mítica Noites Cariocas.
Já na década de 1980, a morte de Elis e John Lennon dão um toque de dramaticidade ao livro. Mas logo o clima se eleva de novo com surgimento do Rock Brasil com a Blitz, Gang 90, Paralamas entre muitos outros citados por Motta.
Para o fim Nelson Motta deixou a descrição de como orientou uma garota - então com 19 anos - até chegar hoje a ser, para muitos incluindo eu, a maior cantora do Brasil: Marisa Monte.
O único senão do livro é a total ignorância na narrativa do que se passa musicalmente abaixo de São Paulo. Tirando Elis e Lupicínio, Motta não cita nada da música gaúcha. Nem mesmo quando fala das bandas de rock cita Engenheiros do Hawaii ou qualquer integrante da cena rockeira gaúcha que tem força desde a década de 1980. Parece que para Nelson Motta música brasileira é do Paraná para cima, vai ver que é por isto que o livro se chama "Noites Tropicais", e como o Rio Grande do Sul está abaixo do Trópico de Capricórnio não faz parte da história contada de forma tão irrestível por Nelson Motta de parte da música brasileira da segunda metade do século XX.
Classificação pessoal e arbitrária: quatro estrelas e meia.
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